Archive for the 'Justiças e Injustiças' Category

o mico do ano.

estive sem atualizar. Semana passada fui pro retreat da empresa, uma reunião dessas de 4 dias em que mandam todo mundo pra um hotel pra fazer exercícios de motivação. Preciso comentar???

Chegamos lá, eu com o espírito de porco super construtivo (o hotel era 5 estrelas e tinha uma piscina enorme). Na primeira reuniãsao entram dois senhores asiáticos gritando nos microfones. Nos ensinaram os 3 gritos que usaríamos a cada 20 minutos durante 4 dias:

Ele gritava SELAMAT e a gente tinha que responder gritando e motivado PAGI (é tipo, bom dia)

Depois ele gritava PERNAMBAM (ou qualquer coisa assim qeu em 6 meses eu só aprendi 10 palavras de Bahasa) e as pessoas gritavam SAYA!

Por fim UNDP e o grito era GO GO GO (em algum momento substituido por GETTING BETTER AND BETTER).

Bom, esse era o mico institucionalizado. E fica pior.

Não vou fazer comentários sobre os diferentes exercícios de motivação. Na minha opinião são inúteis. Quer me motivar? Me paga bem, me faz trabalhar de acordo com os termos de referência e de vez em quando paga a minha cerveja. Se me leva pra um hotel 5 estrelas, me meter dentro de uma sala gritando essas coisas o dia inteiro é desmotivante. Quer me motivar, DEIXA TEMPO PRA EU USAR A PISCINA E, OUTRA VEZ, PAGA A MINHA CERVEJA.

Ok.

Então em uma noite decidem fazer a noite cultural. Em que todos, TODOS, temos que participar. Dividem as pessoas pela região de onde vêm. Como eu sou a única Latino Americana do escr itório me puseram no grupo do Unidos de Qualquer Lado: Brasil, Europa, Ásia Central e Norte da África. Sorte que existe uma unidade cultural enorme entre o Brasil, a Albania, o Marrocos, o Cazaquistão e Usbequistão, a Itália e a Suécia. Pra melhorar no meu grupo estavam o representante do PNUD no país , o Diretor e a Deputada (os 3 cargos mais altos da empresa). E claro, qual era a minha função?

Sambar.

Sim eu tive que sambar na frente de 160 indonesos (40% homens) muçulmanos e TODOS os super chefes. E sorrindo. Porque não podia sair xingando a mãe de todo mundo.

Pra piorar no meio da “dança típica” algum FDP gritou “UNDP GO GO GO”.

Comentários?

Ps1: já imaginou o que a ONU poderia fazer com a dinheirama que se gastou nesse retreat? considera que tem 2 por ano…

Questão de fé.

Ontem fui ao cinema. Aqui existe uma sala “premiere” em que as cadeiras se transofrmam em quase camas e te dão um cobertorzinho para sobreviver ao ar condicionado. Enfim, não é importante.

Fui assistir Defiance, lindo filme sobre um tema que descobri ontem, não consigo mais digerir. Nazismo. O primeiro sintoma foi quando assisti “O menino do pijama listrado”, pouco antes de vir, com o Fer. No meio do filme não podia mais estar na sala, uma mistura de ansiedade com ansia de vomito me obrigava a sair e entrar, e na terceira vez acabei ficando fora e assistindo o filme do vidro da porta da sala do cinema.

Chorei a noite toda. E achei que era mais da tristeza por vir que pelo filme. Ledo engano. Desde então venho fugindo de qualquer reportagem, noticia, programa, qualquer coisa, sobre o assunto. Até que ontem, meio desavisada, fui assistir Defiance.

Não podia olhar a tela, me escondia embaixo da coberta como quando pequenos nossos irmão mais velhos nos fazem assistir sexta feira 13. Uma mistura de ansiedade com ansia de vomito vinha perturbar a “caminha com coberta e pipoca no cinema”.

Saí do cinema muda, o rosto coberto de lágrima, tentando descobrir a razão da intolerancia (a minha em relação ao assunto). O único pensamento era: aconteceu, voltou a acontecer e não duvido, nem por um segundo, que eu veja isso outra vez. Mais, tenho medo, medo porque vejo todos os dias notícias cada vez mais assombrosas sobre a tal imigração.

Mas não é isso, isso me geraria revolta, raiva, não desespero. Não é. O problema é outro.

O problema é que cada vez que vejo um pouco mais de tudo isso perco a única coisa que me move. A minha fé. Não em Deus, na humanidade. Ainda que pense nos líderes, naqueles que sobreviveram, naqueles que lutam, naqueles que…

No fim do dia, talvez tenha razão Tuva. Nossa resistencia será viver.

algo parece estar fuera del orden… fora da nova ordem mundial

Sexta feira, Jakarta. Chego do trabalho destroçada depois de 15 discussões sobre a crise financeira, com a UNICEF, ILO, WFP, UNDP e muitas outras dessas agências internacionais que tem siglas (não, com o FMI não). Chego em casa com a perspectiva de trabalhar no fim de semana, pra esquecer ligo a TV, abro a minha Bintang e vejo algo que mostra que realmente tem alguma coisa fora do lugar.

A BBC Mundo, canal de noticiario bastante conhecido, passa um programa de análise das principais notícias (headlines) dos jornais. E se detém naquela que diz que Lula não foi à Davos e ficou no Fórum Social Mundial. Eram 4 analistas / especialistas, discutindo as implicações dessa atitude. Os impactos nas relações internacionais, no refinanciamento de 64 milhões de dólares, na oportunidade de juntar-se aos grupos dos ¨poderosos¨e discutir e influenciar – segundo eles – nos caminhos dessa crise. Enfim, eram 4 analistas, num dos principais canais de notícias do mundo, analizando o impacto da atitude do presidente – operário, que veio da pobreza (essa era parte da explicação de um dos analistas) – do Brasil, aquele país bem grande considerado em desenvolvimento.

Não tenho reação, mas essa crise deve estar abalando profundamente a tal da ordem mundial. Porque isso é algo. Não sei o que, mas é algo. E quem puder que me explique.

Medicina Neoliberal

Então faz umas duas semanas que eu estou tendo dores de cabeça meio fortes, por longos períodos de tempo . Como aqui eu tenho seguro, pensei, melhor dar uma passada no médico, ver se tá tudo bem.

Então, depois de um pequeno tramite com a minha seguradora em Madrid fui visitar a clínica chamada Global Doctors, na parte mais rica de Jakarta. A indicação foi essa, porque lá os médicos falam inglês e em medicina comunicação é tudo!

Um médico chamado Nazir me atendeu. Fazendo um exame “minucioso”, perguntou o que acontecia eeu educadamente expliquei.

– Tenho tido dores de cabeça meio fortes nas últimas semanas. Acompanhadas de um pouco de náuseas e…

– Você tem problemas pra dormir?

– Não durmo bem. Mas eu acordo cansada e às vezes a dor de cabeça passa de um dia pro outro.

– É toda a cabeça é só uma parte?

– Só uma parte (mostrei a parte).

-Mas você dorme bem?

– Sim eu durmo bem. Só tenho a sensação de que não descanso tanto porque fico cansada durante o dia.

– A senhora está estressada?

– Quem não está meu senhor. Vítimas em gaza, o transito, o trabalho, a poluição, 200 milhões de pessoas vivendo abaixo da linha de pobreza, o senhor me fazendo perguntas irritantes, o trabalho que vai meio lento, a distancia das pessoas queridas.  Pensei. E respondi “é, um pouco”.

– Mas então tem problema pra dormir.

– Não, não tenho!

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Aí ele tirou minha pressão que é normalmente baixa e disse.

– Tá normal, gente com dor de cabeça costuma ter pressão alta.

Aí apertou como uma boneca (que aqui assédio sexual é assunto sério) meu ombro e nuca e disse: muscular não é.

Voltamos à mesa e ele conclui. Você tem exaquecas (migrania) provavelmente por tensão e stress. E começou a receita com 4 remédios: Ponstan, Xanax, Plasil e Carfog.

Perguntei se le poderia fazer um exame de sangue, porque há tempos eu não checava e tinha mudado muito minha alimentação. O moço diz:

– Exames? Ok.

– Sangue, diabete, urina, ultrassom do abdômen pra checar os rins, um papa nicolau e uma radiografia da cabeça, vai que é sinusite.Ah, e um de vista por se por acaso seu óculos está ruim, pode dar dor de cabeça. Ah, e faz jejum de umas 8 ou 12 horas, é melhor pro exame de sangue.

– Vai que é sinusite? Vai que é o óculos? Como o senhor me receita 4 medicamentos sem saber o diagnóstico, que está entre migrania, problemas de vista e sinusite? Pensei mas não falei, que fazer um check-up não era má idéia e brigar com o médico não parecia uma boa naquele momento. Como explicar pro seguro que queria ver outro médico porque sim? (eles têm que aprovar qualquer coisa). Ainda assim, acho que ele não receitou nenhum outro exame porque não lembrava o nome.

Saí da sala já imaginando a bola que ele ía ganhar da clínica por tirar dinheiro do seguro.

Na saída passei pela recepção pra assinar os papéis do seguro, pela consulta. O cara me fez esperar meia hora porque tava tentando conseguir aprovação do seguro pros exames. Não conseguiu e me disse:

– Sabe o que? Assina já os papéis do exame, porque o seguro certeza vai aprovar então já fica resolvido.

Aí a exploração já era meio evidente. Então com muita amabilidade lhe perguntei:

– Meu senhor, eu já fiz os exames?

– Não.

– Já recebi os resultados?

– Não.

– Já estou melhor?

– Não.

– Então, até as três respostas serem sim o senhor não vai cobrar o seguro, sim?

E saí.

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Então eu que não tomo nem tylenol quando tenho dor de cabeça decidi não tomar nada até sairem os exames e claro, checar todos os remédios na internet. E claro, os remédios são totalmente sem noção.

Um é Xanax, aparentemente um ansiolítico para tratar casos moderados a grave de ansiedade e síndrome do pânico. Com alto potencial pra viciar o usuário e uma lista considerável de efeitos secundários. Ah! O melhor, a recepcionista enquanto entrega o remédio me explica. esse é tipo um remédio pra dormir, mas um pouco diferente. Eu respondo: EU NÃO TENHO PROBLEMA PRA DORMIR!

O outro carfog é um super forte pra migranias, vaso dilatador indicado pra casos avançado (segundo a internê).Também com uma listinha interessante de efeitos indesejados.

E Ponstan não precisava checar que eu conheço e me dá um sono que dói.

Conclusão, se eu tomar os 4 remédios combinados como pediu o médico eu vou ter um barato forte, posso ser atropelada e definitivamente não poderei operar nem um computador.

E tudo isso pra que? Pra tirar um par de rúpias do seguro. Eu culpo o capitalismo, o neoliberalismo e o cretinismo do médico. O cara é médico!!!! enfim…

Festinha da empresa e ataques em Gaza.

Sabe quando a empresa convoca reunião geral e faz o bolinho dos aniversariantes do mês? Discute os resultados do ano, os do próximo ano e fala de questões importantes que nos afetam (certeza esse ano o tema foi a crise financeira). Então eu tive a versão ONU way of life dessa prática comumente compartida pelas gordinhas do RH. Só que com nome chique, General Staff Meeting, e em lugar chique – nem tanto – Jakarta.

Foi assim, o representante da ONU pra Indonesia fez um discurso bem bonito sobre como trabalhamos bem em 2008 e ainda assim não estamos nem perto de alcançar os objetivos do milênio, como trouxemos muitos dinheiros dos doadores, tipo AUSaid, Brtitish Embassy e outros, como tivemos o prazer de sediar algumas reuniões internacionais e a incrível organização das mesmas e o gostoso que estavam as coxinhas. Depois falou do desafio de em 2009 melhorar a qualidade dos programas, conseguir um prédio novo e responder bem as pesquisas de avaliação dos dirigentes (sendo que 2 dos 3 dirigentes consideram equivalentes as expressões “responder bem” e  “falar bem”).

O pesosal de Papua fez o favor de informar como estão as pessoas e o estado da província depois dos dois terremotos escala 7 que aconteceram lá nos primeiros dias do ano. Detalhe, o tema não estava na agenda, tiveram que publicamente pedir pra colocar.

Por fim rolou a premiação dos funcionários. Sim porque fazem tipo um OSCAR funcionário do ano, com categorias do tipo: on the call – o famoso quebra galho, on your service – ou puxa saco faz tudo, just in time – que tá sempre na hora certa fazendo a coisa errada. Premiaram as equipes mais unidas, as gordinhas do RH, premirama até quem vai em toooooooooodos os treinamentos (foram 34 no ano).

E eu ali sentada, olhando batendo palma de macaco e esperando o momento que a reunião ia chegar na questão em que todo mundo está preocupado, imagino eu, dentro da ONU, ainda mais num país muçulmano: os ataques terroristas de Israel à palestina.

Então a premiação acabou. O pessoal levantou e foi vorazmente devorar os bolinhos, cafézinho e cházinho da mesa do lado. E não teve um, nem um, NADA, de comentários a respeito de assunto. Assunto que provocou manifestações populares na frente do edifício e muitos gastos com sms do departamento de segurança avisando os funciónarios de onde estavam os protestantes, assunto que trata de pessoas morrendo (civis, não civis, crianças, mulheres…), de decisões não tomadas pelo facismo do conselho de segurança, decisão que afeta os 200 milhões de muçulmanos da Indonésia (por não cair no óbvio de comentar os de Gaza). Nada nem uma palavra.

Não sei porque mas não deu pra comer os bolinhos. Perdi a fome.

cegos-surdos-e-mudos